Elegia a uma cidade destruída por catástrofe

Era 1995. Meu primeiro computador. Aliás, meu primeiro jogo de computador, também. Menino Tarrask (que só ganharia esse nickname no ano seguinte) estava completamente viciado no Sim City 2000, botando casa aqui, autoestrada acolá, aeroporto em todo canto pra ver se os avioezinhos se chocavam, business as usual.

Só que tinha o porém.

Porém, meu pai, numa dessas paranoias esquisitas de quem ainda não tinha sacado direito a tecnologia, tinha lido em algum lugar que pouca memória deixava o computador devagar. E então me mandou não guardar nada no computador. Nenhum arquivo de jogo, essas besteiras de menino. Trabalho da escola até podia, mas o resto não.

Então, eu-menino-viciado-no-jogo, guardava a minha cidade favorita num disquete de 1.44 megabytes, uma enormidade. Eram milhões de habitantes virtuais que viviam suas vidas ali, sem nunca sair, conversando, brigando, se movendo, fazendo mimimi (mais ou menos como no twitter, né?).

Chegou a hora do até que.

Até que, sem que ninguém de bom-senso esperasse (ou seja, ninguém que eu conhecesse, porque eu-do-futuro adivinharia isso em 30 segundos), o disquete falhou. Deu erro. Não lia mais. Desmagnetizou. Existem mil maneiras de fazer um disquete parar de funcionar, até mesmo ficar perto de um telefone celular (que eu nem lembro se tinha algum em casa na época, eu não tinha).

Num instante, naquele disquete onde viviam milhões de criaturas virtuais só sobrou deserto. Nada.

Mas veja o lado bom.

Toda grande tragédia que mata milhões de pessoas pode trazer boas lições, desde que você não seja uma dessas pessoas. A minha foi extremamente útil.

Todo sistema de armazenamento de memória morre.

Não discuta. Não escute e depois esqueça. Não deixe pra depois. É como saber que a gente vai morrer, só que pior. É pior, porque você pode fazer algo em relação ao seu HD. Quanto a morrer, nem vai rolar. Todo mundo acaba embaixo da terra. Mas as suas fotos, documentos e histórico médico (tem gente que guarda essas coisas, talvez até na esperança de demorar mais pra morrer) podem continuar com você em dois ou três discos e memórias diferentes. Deixa os arquivos no computador, no backup e faz um backup do backup. É assim que funciona. Qualquer coisa menos que isso é jogar na loteria.

Porque, como diria o ditado, seguro morreu de velho, mas sem nenhuma das selfies que tirou durante a vida inteira, porque perdeu-as todas quando era jovem.

Esta semana, terminei de resgatar 700 gigas de fotos da esposa, praticamente todas as que ela tirou durante a vida digital, e umas boas partes dos arquivos de trabalho de designer por vários anos. Só porque ela tinha esquecido de fazer o backup do backup. Aí fica a segunda dica: quando já tiver dezessete HDs espelhados, também compre um programa de restaurar dados de discos que estão morrendo.

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